Coletivo Zozulenka Marusia Коллектив Зозуленька Маруся legendado
Leia versão escrita: fishuk.cc/marusia
Estava com saudade das músicas típicas ucranianas. Conheci esta por acaso, chama-se «Маруся» (Marusia), que na Rússia e na Ucrânia é diminutivo carinhoso dos nomes Maria e Marina (ucr. Maryna). É de domínio popular, ou seja, autoria anônima, e neste vídeo é cantada pelo Coletivo Zozulenka (Зозуленька).
Culturalmente falando, a música dá muitos traços folclóricos que ucranianos partilham não apenas com Rússia, mas também com países eslavos ocidentais, como o nome/apelido Marusia, também usual na Polônia, e o viburno (калина), nossa já conhecida baga. Aliás, notem que o refrão tem estrutura quase igual à da música russa «Kalinka-Malinka», que postei há algumas semanas (http://fishuk.cc/kalinka): a comparação do viburno com uma bela jovem (por isso «feminizo» o substantivo, isto é, «viburna») e sua colocação (com colheita ou fruição) num jardim. No meu artigo que citei acima, leiam muito mais sobre a presença do viburno na cultura russo-ucraniana e sua ligação à jovem beleza feminina.
No domínio ucraniano em si, «Marusia» indica figuras moças e femininas semilendárias nos relatos épicos e tradições nacionais. Marusia Boguslavka teria sido uma jovem que, segundo uma balada épica, foi tomada pelos turcos e vendida pro harém de um poderoso «khan». Tanta confiança teria obtido do esposo que, obtendo a chave de uma prisão, libertou alguns cossacos ucranianos presos, mas ela mesma não fugiu, por estar acomodada à própria situação. O poema teria figurado os ucranianos que, mesmo muito longe da terra natal, guardavam fortes laços com ela. Não se sabe bem quando a moça teria vivido, talvez no primeiro quartel do século 17, mas a balada épica só se publicou pela primera vez em 1856. A cantora e poeta Maria (Marusia) Churai também viveu de 1625 a 1653 em Poltava, mas pouco se sabe da sua vida, embora algumas canções muito famosas na Ucrânia sejam atribuídas a ela. Seu nome e escritos ficaram célebres com a renascença nacionalista, durante o século 19.
Tem ainda a temática cossaca e cortesã que impregna a música e poesia da Ucrânia. Como na canção «Ei, falcões» também já posta aqui (http://fishuk.cc/sokoly), a jovem simples recebe galanteios de um cossaco moço, dividido entre deveres da guerra e impulsos do amor. Da mesma forma, há confusão constante entre o personagem masculino e o próprio narrador: ora canta-se «Ele fez», «Ele deu», ora fala-se «Ela me deixou», «Estou triste», dando a entender que a vida e o sentir do figurante também eram ou poderiam ser do compositor ou qualquer outro ucraniano. As bagas são frutos comuns na Europa Oriental, e enquanto em «Kalinka-Malinka» o viburno (árvore cujo fruto é a «kalina» russa ou a «kalyna» ucraniana) aparece com a framboesa, aqui aparece com a cereja (vyshnia). Todos são ligados à beleza das moças jovens e brejeiras, e não à toa eles são do gênero feminino. A pluralidade estética também aparece: no refrão, fala-se de jovem morena (mais exatamente, de cabelos pretos), e mais à frente menciona-se uma loira como alvo do desejo.
A canção «Marusia» é rica ainda em exemplos aos aprendizes do ucraniano como língua estrangeira. Há toda uma aula sobre diminutivos (bem mais usados nas línguas eslavas do que no português), formados com os mais diversos sufixos, em geral de feição carinhosa ou eufêmica: криниця (krynytsia, poço) → криниченька (krynychenka), дівчина (divchyna, moça) → дівчинонька (divchynonka), козак (kozak, cossaco) → козаченько (kozachenko), невелика (nevelyka, pequena) → невеличка (nevelychka). Até um «diminutivo do diminutivo»: відро (vidró, balde) → відерко (viderko) → відеречко (viderechko)! Alguns morfemas gramaticais são comuns na poesia ou músicas, em nome da métrica, e lembram o padrão do russo: os verbos terminados em -ть no infinitivo, quando o comum é -ти, como em спочивати (spochyvaty, descansar) → спочивать (spochyvat), копати (kopaty, cavar) → копать (kopat); um adjetivo singular feminino terminado em -ая, quando o comum é -а, que é чорнявая (chorniavaia, morena, de cabelos pretos) ← чорнява (chorniava).
O Coletivo Zozulenka é mais um que mistura batida eletrônica com música folclórica tradicional, cantando sobretudo canções populares. «Zozulenka», aliás, é outro diminutivo, o de «zozulia», ou «cuco» (pássaro), e também se usa como sobrenome. O vídeo sem legendas que baixei está nesta página: youtu.be/rgMkOGqaceM. Na verdade, «Marusia» em geral se toca com dança, mas não gostei da qualidade gráfica de alguns vídeos que têm apresentações no YouTube: um com vários homens e mulheres na performance (http://youtu.be/rvsCfpfPSGE) e outro, só algumas moças (http://youtu.be/js1sQs5DOXw). Antes de legendar, traduzi a partir desta letra, embora no vídeo haja umas poucas diferenças: goo.gl/4v2jPk.
#eslavos #rússia #ucrânia #história #moscou #política #notícias #latim #música #eurásia #idiomas #documentários #urss #traduções #comunismo
Estava com saudade das músicas típicas ucranianas. Conheci esta por acaso, chama-se «Маруся» (Marusia), que na Rússia e na Ucrânia é diminutivo carinhoso dos nomes Maria e Marina (ucr. Maryna). É de domínio popular, ou seja, autoria anônima, e neste vídeo é cantada pelo Coletivo Zozulenka (Зозуленька).
Culturalmente falando, a música dá muitos traços folclóricos que ucranianos partilham não apenas com Rússia, mas também com países eslavos ocidentais, como o nome/apelido Marusia, também usual na Polônia, e o viburno (калина), nossa já conhecida baga. Aliás, notem que o refrão tem estrutura quase igual à da música russa «Kalinka-Malinka», que postei há algumas semanas (http://fishuk.cc/kalinka): a comparação do viburno com uma bela jovem (por isso «feminizo» o substantivo, isto é, «viburna») e sua colocação (com colheita ou fruição) num jardim. No meu artigo que citei acima, leiam muito mais sobre a presença do viburno na cultura russo-ucraniana e sua ligação à jovem beleza feminina.
No domínio ucraniano em si, «Marusia» indica figuras moças e femininas semilendárias nos relatos épicos e tradições nacionais. Marusia Boguslavka teria sido uma jovem que, segundo uma balada épica, foi tomada pelos turcos e vendida pro harém de um poderoso «khan». Tanta confiança teria obtido do esposo que, obtendo a chave de uma prisão, libertou alguns cossacos ucranianos presos, mas ela mesma não fugiu, por estar acomodada à própria situação. O poema teria figurado os ucranianos que, mesmo muito longe da terra natal, guardavam fortes laços com ela. Não se sabe bem quando a moça teria vivido, talvez no primeiro quartel do século 17, mas a balada épica só se publicou pela primera vez em 1856. A cantora e poeta Maria (Marusia) Churai também viveu de 1625 a 1653 em Poltava, mas pouco se sabe da sua vida, embora algumas canções muito famosas na Ucrânia sejam atribuídas a ela. Seu nome e escritos ficaram célebres com a renascença nacionalista, durante o século 19.
Tem ainda a temática cossaca e cortesã que impregna a música e poesia da Ucrânia. Como na canção «Ei, falcões» também já posta aqui (http://fishuk.cc/sokoly), a jovem simples recebe galanteios de um cossaco moço, dividido entre deveres da guerra e impulsos do amor. Da mesma forma, há confusão constante entre o personagem masculino e o próprio narrador: ora canta-se «Ele fez», «Ele deu», ora fala-se «Ela me deixou», «Estou triste», dando a entender que a vida e o sentir do figurante também eram ou poderiam ser do compositor ou qualquer outro ucraniano. As bagas são frutos comuns na Europa Oriental, e enquanto em «Kalinka-Malinka» o viburno (árvore cujo fruto é a «kalina» russa ou a «kalyna» ucraniana) aparece com a framboesa, aqui aparece com a cereja (vyshnia). Todos são ligados à beleza das moças jovens e brejeiras, e não à toa eles são do gênero feminino. A pluralidade estética também aparece: no refrão, fala-se de jovem morena (mais exatamente, de cabelos pretos), e mais à frente menciona-se uma loira como alvo do desejo.
A canção «Marusia» é rica ainda em exemplos aos aprendizes do ucraniano como língua estrangeira. Há toda uma aula sobre diminutivos (bem mais usados nas línguas eslavas do que no português), formados com os mais diversos sufixos, em geral de feição carinhosa ou eufêmica: криниця (krynytsia, poço) → криниченька (krynychenka), дівчина (divchyna, moça) → дівчинонька (divchynonka), козак (kozak, cossaco) → козаченько (kozachenko), невелика (nevelyka, pequena) → невеличка (nevelychka). Até um «diminutivo do diminutivo»: відро (vidró, balde) → відерко (viderko) → відеречко (viderechko)! Alguns morfemas gramaticais são comuns na poesia ou músicas, em nome da métrica, e lembram o padrão do russo: os verbos terminados em -ть no infinitivo, quando o comum é -ти, como em спочивати (spochyvaty, descansar) → спочивать (spochyvat), копати (kopaty, cavar) → копать (kopat); um adjetivo singular feminino terminado em -ая, quando o comum é -а, que é чорнявая (chorniavaia, morena, de cabelos pretos) ← чорнява (chorniava).
O Coletivo Zozulenka é mais um que mistura batida eletrônica com música folclórica tradicional, cantando sobretudo canções populares. «Zozulenka», aliás, é outro diminutivo, o de «zozulia», ou «cuco» (pássaro), e também se usa como sobrenome. O vídeo sem legendas que baixei está nesta página: youtu.be/rgMkOGqaceM. Na verdade, «Marusia» em geral se toca com dança, mas não gostei da qualidade gráfica de alguns vídeos que têm apresentações no YouTube: um com vários homens e mulheres na performance (http://youtu.be/rvsCfpfPSGE) e outro, só algumas moças (http://youtu.be/js1sQs5DOXw). Antes de legendar, traduzi a partir desta letra, embora no vídeo haja umas poucas diferenças: goo.gl/4v2jPk.
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